sábado, 27 de dezembro de 2008

FELIZ ANO 2009 !!


QUE O NOVO ANO NOS TRAGA PAZ, AMOR E ABUNDÂNCIA PARA UM MUNDO MELHOR. FELIZ ANO DE 2009!!

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Quantos seremos?


Não sei quantos seremos, mas que importa?!

Um só que fosse, e já valia a pena.

Aqui, no mundo, alguém que se condena

A não ser conivente

Na farsa do presente

Posta em cena!


Não podemos mudar a hora da chegada,

Nem talvez a mais certa,

A da partida.

Mas podemos fazer a descoberta

Do que presta

E não presta

Nesta vida.


E o que não presta é isto, esta mentira

Quotidiana.

Esta comédia desumana

E triste,

Que cobre de soturna maldição

A própria indignação

Que lhe resiste.


Miguel Torga

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Poema de Manuel Alegre




Letra para um Hino

É possível falar sem um nó na garganta

é possível amar sem que venham proibir

é possível correr sem que seja fugir.

Se tens vontade de cantar não tenhas medo: canta.


É possível andar sem olhar para o chão

é possível viver sem que seja de rastos.

Os teus olhos nasceram para olhar os astros

se te apetece dizer não grita comigo: não.


É possível viver de outro modo. É

possível transformares em arma a tua mão.
É possível o amor. É possível o pão.
É possível viver de pé.


Não te deixes murchar. Não deixes que te domem.

É possível viver sem fingir que se vive.

É possível ser homem.

É possível ser livre livre livre.


Manuel Alegre, O canto e as armas

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Raiz do medo - Um poema de Luís Costa


É hora de soltar o credo

E acreditar!
E todos querem confiar,
Todos se querem capacitar…
Mas quem se capacita?

É hora de soltar o medo
E tentar!
E todos querem ousar,
Todos querem incitar…
Mas quem incita?

É a hora de soltar o grito
E bradar!
E todos querem reclamar,
Todos querem gritar…
Mas quem grita?

É hora de rasgar o mito
E pensar!
E todos querem sonhar,
Todos querem volitar…
Mas quem volita?

É a hora da alvorada,
Mas já ninguém faz nada
Sem que alguém permita!

Luís Costa

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Crepúsculo. Um poema de Luís Costa


A cada dia que passa,
Mais doze mestres se vão!
Resta a tísica carcaça
De um triste corpo sem raça,
Prostrado no sujo chão!

Vão-se os nobres cavaleiros,
A alma do batalhão,
Ficam os novos braceiros,
Mais pacatos, mais ordeiros,
Mais dados a sujeição.

As sentinelas rendidas
Desertam do quarteirão:
Nada fazem, estão vendidas
E assistem às partidas
De lenço branco na mão!

Vai-se o senado embora,
Sem honra nem gratidão!
Neste Portugal de agora,
Há um futuro que chora
No silêncio da Nação!

Luís Costa

domingo, 12 de outubro de 2008

Quando o dia amanhecer - Um poema de Luís Costa












Quando o dia amanhecer

Eu quero estar acordado
Para ver o Sol crescer
E a luz resplandecer
No teu rosto animado

Quando esta noite sombria
Sem estrela nem luar
Morrer nos braços do dia
Eu vou rever a alegria
No brilho do teu olhar

Quando esta noite de breu
Der lugar ao céu azul
Serei livre em jubileu
Como uma ave no céu
Volitando para Sul

Quando o dia amanhecer
Vou estar bem acordado
Para ver o Sol reger
Ver a luz recrudescer
E ser feliz a teu lado


Luís Costa

sábado, 11 de outubro de 2008

Hino da Indignação - Um poema de Luís Costa

Professores de Portugal


Gente nobre e dedicada
Força fértil e vital

Desta Pátria sufocada
Acorrei todos à praça
Resgatar a Educação
Perdida na nevoaça
Do Outono da Nação

Está na hora de lutar
Com a nossa indignação
Está na hora de bradar
É preciso dizer NÃO

NÃO à condição servil
NÃO à vã mediocridade
NÃO à demissão de Abril
Aos chacais da liberdade
NÃO ao sonho amordaçado
NÃO ao silêncio da voz
NÃO à perda do legado
Da Escola de todos nós

Está na hora de lutar
Com a nossa indignação
Está na hora de bradar
É preciso dizer NÃO

Luís Costa

sábado, 4 de outubro de 2008

MIGALHÃES



Lá vem pelo avelar

O filho do Zé João

Vem do centro escolar

Cansado de palmilhar

A caminho da povoação

Não há médico na aldeia

E a antiga escola fechou

Não tem carne para a ceia

Nem petróleo para a candeia

Porque o dinheiro acabou

O seu pai foi para França

Trabalhar na construção

E a mãe desta criança

Trabalha na vizinhança

Lavando pratos e chão

Mas o puto vem contente

Com o Migalhães na mão

E passa por toda a gente

Em alegria aparente

De quem já sabe a lição

Um senhor muito invulgar

Que chegou com mais senhores

Veio para visitar

O novo centro escolar

E dar os computadores

E lá vem o Joãozinho

No seu contínuo vaivém

Calcorreando o caminho

Desesperando sozinho

À espera da sua mãe

Neste país de papões

A troco de dois vinténs

Agravam-se as disfunções

O rico ganha milhões

E o pobre Migalhães


Luís Costa

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

O último sumário...

A aldeia descansava no cimo de um cabeço, entre um espelho de água fria, recém-nascida — convidativa à contemplação do ventre da terra — e as ingremidades rugosas da serra carrancuda, impondo o seu corpanzil rochoso ao casario granítico minúsculo, discretamente aninhado num leito de carvalhos e sobreiros, parecendo torcer o nariz ao povo que, de sol a sol, lhe esgaravatava a pele. O ar transparente das montanhas rescendia à humosa textura do chão, ao feno seco e amarelado das medas coniformes, ao inconfundível hálito céltico do Gerês. Na calma vespertina daquele lugar primordial, retinia o silvo metálico de uma enxada, ressoando insistentemente contra as paredes da montanha, e o gemer de um carro de bois, que rasgava as estreitas e umbrosas ruas do burgo, adormecido sob o lençol de estio que o Agosto lhe impunha. Do cimo de um pequeno outeiro, sobre os cambados telhados de argila, espalhava-se um alegre chilreio de crianças, como floral perfume do futuro espargido sobre a aldeia. Vinha do recreio da antiga escola primária


Ladeado por dois ciprestes carregados de verde, o pequeno edifício, guardado por um muro já tolhido pelos arremessos do Inverno, jazia sobre um descampado, onde as plantas silvestres se tornavam senhoras, por usucapião. No seu rosto envelhecido, belos adornos de cantaria e uma haste, em diagonal, apoiada sobre uma pequena mísula de granito saliente da espessa alvenaria da parede. Por detrás, no antigo recreio, alguns rapazotes, em jeito caprino, disputavam a posse de uma bola mágica, que ziguezagueava ao ritmo frenético dos pontapés. Ao fundo do terreiro, duas pedras disformes compunham o cenário da baliza, para onde convergia a ilusão dos pequenos Ronaldos.

No interior da escola, um ar húmido e mofoso pesava sobre o soalho carcomido e atapetado pelo pó, que rangia os dentes a cada passo que eu ousava dar. Os esqueletos das carteiras, também eles em evidente decomposição, descaíam para o chão, para a terra que já foram, para aquilo em que haveriam de transformar-se, antes de ressurgir, em botânica forma. Ao fundo, sobre o estrado, a secretária, de sólida madeira de castanho, hibernando silenciosamente, resistia à vertigem do tempo, à voragem de uma época nua de ideais, devoradora compulsiva de raízes. Por trás, voltada para o quadro, a cadeira do professor parecia eternizar o último acto do mestre, quando dela se ergueu para escrever o último sumário, no quadro negro, sobre o qual era ainda visível a marca de um crucifixo, que alguém não deixou ficar ali, naquela sala vazia, penumbrosa, votado ao abandono.

Um véu de melancolia repousava sobre todo aquele lugar habitado pelas brumas de outrora, numa dimensão em que todos os gestos, todas as palavras, todos os sorrisos se perpetuam, para se repetirem infinitamente, até um dia poderem emergir do impossível.

Uma folha solta, esquecida num canto, sob a enorme vidraça esventrada, esperando debaixo de um xaile de tempo, despertou a minha atenção. Levantei-a pela ponta dos dedos e voltei-a para mim. Era este simples registo de um diário, já com três anos de dormência:

«Hoje a senhora professora ainda veio à escola, mas não tinha meninos, por causa da neve. Hoje, os alunos deram feriado à senhora professora!».
Luís Costa

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Manifesto Anti-Sarcos




Basta!
Morra o Sarcos! Rá-tá-tá!

Abaixo a arrogância, a prepotência!
Abaixo a jactância e a impostura
Escondida na armadura
Fashion e macia
Desta macilenta democracia!

Basta!
Morra o Sarcos! Rá-tá-tá!

O Sarcos é um bacano
O Sarcos é um porreiro, pá,
Eleito por engano
Em domingo de nevoeiro!
O Sarcos tem um canudo
De cortiça
Um canudo de Entrudo,
Com fitas e tudo,
Comprado depois da missa!


Basta!
Morra o Sarcos! Rá-tá-tá!


O Sarcos mente ao país
Com quantos dentes tem!
Cala e fala a preceito
E não sabe o que diz.
O Sarcos não respeita ninguém
O Sarcos não tem coração:
Manda e desmanda sem jeito
O Sarcos é um anão
Do Socialismo e do Direito!

Basta!
Morra o Sarcos! Rá-tá-tá!

Um país que tem Sarcos
É um feudo ordinário,
Que fabrica pobreza
Para alimentar a avareza
Do gordo milionário!
O Sarcos vai dar de frosques,
Porque é um Robim dos Bosques
Virado ao contrário!

Basta!
Morra o Sarcos! Rá-tá-tá!

O Sarcos é um corvo,
Augúrio do retrocesso
E da liberdade esganada!
O Sarcos é um estorvo
Um empecilho de alabastro
Que nos impede o progresso!
Arranquemos este emplastro,
Esta excrescência da política
Que leva à derrocada
E à liberdade somítica!

Basta!
Morra o Sarcos! Rá-tá-tá!

E como se abate
Este bicho ignoto?
Com arma de chocolate:
O VOTO!

Basta!
Morra o Sarcos! Rá-tá-tá!

Luís Costa

domingo, 28 de setembro de 2008

Quero voltar ao Terreiro do Paço...

Terreiro do Paço - Um poema de Luís Costa


Quero voltar ao Terreiro do Paço,

Onde a chave do sonho se perdeu!
Quero voltar àquele mesmo espaço,
Repetir a força daquele abraço,
Tocar, de novo, címbalos no céu!

Quero muito voltar àquela praça,
Onde a voz da liberdade se ergueu!
Quero ver o peito daquela massa
Humana, sem refreio nem mordaça,
Tocar, de novo, címbalos no céu!

Quero voltar ao rossio claustral,
Resgatar o sonho que se perdeu,
Respirar, de novo, aquele ideal,
Que já foi a alma de Portugal,
Tocar, de novo, címbalos no céu!

Luís Costa

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Pasto Florido


Pasto florido - um poema de Luís Costa

Os abutres vão desenhando
Círculos negros no ar,
Enquanto as hienas, salivando,
Vão espreitando
A hora certa de atacar.
Na planura descampada,
Confiante e distraída,
Vai pastando a manada,
Submissa e condenada
Ao fero ciclo da vida!
Neste pasto florido,
Quem não come... é comido!
Um leve cicio do vento
Traz o perigo em segredo!
E o cheiro pestilento
Daquele bando sangrento
Semeia, no pasto, o medo!
A bicharada mais esperta,
Recuando acobardada,
Aninha-se, pela certa,
No centro, que se aperta,
Do denso corpo da manada!
Neste pasto florido,
Quem não come... é comido!
A ala mais destemida,
Valente e denodada,
Enfrenta a trupe bandida,
Pagando, com a própria vida,
A vida da bicharada!
E uma raposa astuta,
Lá no cimo, nas alturas,
Vai brandindo a batuta,
Redesenhando na luta
Mais intrigas e urdiduras.
Neste pasto florido,
Quem não come... é comido!

Luís Costa

domingo, 21 de setembro de 2008

Não te entregues, ó professora!

Um poema de Luís Costa

NÃO TE ENTREGUES

Não te entregues, Ana Maria,
Que a esperança não morreu!
Não te entregues, todavia,
Que o lúcido raiar do dia
Já anuncia o jubileu!

Não te entregues, professorinha,
Que a clara manhã já lá vem!
Não cedas à noite mesquinha
Que a aurora já se adivinha
Na estrelinha que a brisa tem!

Não te entregues, Ana Maria,
Mantém o corpo puro e são!
Não o dês à velhacaria,
À mão torpe da chularia,
Que te esvazia de ilusão!

Não te entregues, ó professora!
Resguarda a tua dignidade,
Repele essa mão impostora,
Essa vontade ditadora,
Resiste até à claridade!

Não te entregues, Ana Maria,
Que já lá vem a luz do dia!

Luís Costa

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Amizade...




A amizade
Para quê descrever
Se a posso receber,
Se a posso sentir
E mal definir?

Amizade
É amor, é carinho
O nunca estar sozinho.
Para quê descrever?

A amizade
Não tem cor, altura,
Raça ou cura.
É uma palavra amiga
Que nunca está perdida
Para quê descrever?
É ter-te…


Safira

terça-feira, 2 de setembro de 2008

No teu olhar...


No olhar podemos ver
quem ama,
o que sente,
se tem poder.

No olhar podemos
quem nos ama,
o que sente,
o quanto nos ama.

No olhar podemos ver
quem nos quer,
o que quer,
o quanto nos quer.

No teu olhar posso ver
se me amas,
o que queres,
se me queres.

No teu olhar posso ver
quem eu quero,
quem tu queres,
o que queres.

No teu olhar posso ver
se é o fim,
quando é o fim,
porque é que acabou.

Sem te olhar
posso dizer,
que acabei,
o que não comecei.

Safira

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

O silêncio permite-nos...

Pintura de Safira

O silêncio permite-nos ter uma vida interior, algo que não navega ao
sabor da pressa, da anarquia das sensações ou das notícias.
Olha! Talvez qualquer coisa como a que se sente ao olhar as cores do
entardecer ou miríades do arco – íris.
Algo longe, muito longe, do reboliço do superficial, do diz que diz,
do supérfluo, do tonto e do bacoco que inflaciona esta terra.
É pelo silêncio que se entra noutra dimensão.
Talvez por isso adore a noite e o seu silêncio.
Mais do que pelas palavras é pelo silêncio que se entra na casa do ser (Dasein
chamava-lhe Heidegger). E era importante que lá entrássemos, porque,
quanto a mim, só assim nos aproximaremos da nossa dimensão humana.
Todos devíamos ter um pouco de pastor, o clássico vizinho das grandes
paisagens bucólicas e das estrelas.
Mas tu, que tens intuição, diz-me: por que fugimos de nós próprios,
de estarmos a sós connosco mesmos?
Será que temos medo da solidão ou temos receio de pensar naquilo
que nos pode complicar a vida ao desnudar os nossos mais profundos sentimentos?
Vá lá, ajuda-me… Eu quero compreender…
Ah! Dizes-me que eu própria sou incompreensível… É?
Está bem. Talvez seja isso. Talvez…Não queres conversa comigo. Já
percebi. Fiquemo-nos então pelo que apregoei. Vale?
Escuta…Escuta o silêncio…Ouve bem! Vês que também fala… Até um dia!...
Bom! Talvez, te deixe em paz, não te aborreça mais.
Para decidir vou consultar o silêncio.
O silêncio que não pode ser silenciado. Ou pode?Não, não pode.
Faz parte da memória e é pela memória que evoco os meus tempos de estudante.
É pela evocação, em momentos de nostalgia, que a torno ausência presente.
Uma noite boémia. Uma tertúlia na Velha Escola de Artes,
sei lá, mesmo uma escaramuça, uma melancolia indescritível ao relembrar
o Velho Galinheiro (A sineta velha triiiiimmmm, meu amor chama por mim…),
chamando para as aulas.
Um encontro de amor mais aconchegado ali mesmo no banco de jardim ,
(Lágrimas que a gente chora…que elas vão e não voltem mais).
Um beijo mais ousado a saber a clandestino ,
com o amado que vejo de rugas, cabelos brancos...
Uma tarde sentada junto ao Tejo ou uma serenata às
tantas da Madrugada, tão tonta e tão doce...
Enfim! Uma serena nostalgia, uma doce saudade...

Sorriso terno,

Safira

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

A um amigo...

Pintura de Safira

Se o simbolo da amizade é uma flor,

Se oferecer flores é ternura,

Aqui tens a ternura da amizade,

São para ti estas flores!

Safira

terça-feira, 29 de julho de 2008

Nostalgia...

Pintura de safira

A saudade hoje está comigo
Parece-me hoje familiar,
Porque esquecer eu não consigo,
Porque sem amigos é impossível continuar.

A saudade sabe a nada
A um nada que a nada cheira,
Um nada que tudo nos tira,
Que nos deixa nada que se queira
Que nada nos pode trazer,
Que dia após dia
Nos vê morrer.

Sinto-me vazia
Vazia de tudo, vazia de ti
Que te foste de repente
Que me abandonaste como uma brisa quente
Que nunca mais senti.

Olho agora lentamente para o infinito
Onde estarás tu no meio de tantas estrelas?
No meio de todo este mundo esquisito
Que daria para tingir centenas de bonitas telas.

Safira

segunda-feira, 28 de julho de 2008

O Alentejo é uma terra linda...

Pintura de Safira

Alentejo meu...
Quanta saudade bate por terra de encanto,
terra de esperanças renovadas
onde se respira serenidade
e os dias são mais luminosos e belos.
São escassos os dias que faltam
para que eu possa rejubilar de alegria
por meus olhos te verem de novo,
meu jardim de flores silvestres a brotar
no campo e em cada recanto,
por entre os espinhos e as pedras e
contra a aspereza do tempo seco.
No teu perfume que me inebria
restauro forças para mais uma etapa...

domingo, 27 de julho de 2008

Poeta António Aleixo

António Aleixo nasceu em 18 de Fevereiro de 1899 em Vila Real de Santo António e faleceu em 16 de Novembro de 1949 em Loulé.
Foi guardador de cabras, cantor popular de feira em feira, soldado, polícia, tecelão, servente de pedreiro em França, “poeta cauteleiro”.
Apesar de semi-analfabeto deixa a seguinte obra escrita que o Dr. Joaquim Magalhães teve o cuidado de passar a limpo: «Este livro que vos deixo», «O Auto do Curandeiro», «O Auto da Vida e da Morte», o incompleto «O Auto do Ti Jaquim» e «Inéditos».
Em homenagem ao Poeta e à sua obra, no parque da cidade de Loulé foi levantado um monumento frente ao “Café Calcinha”, local outrora frequentado pelo Poeta.
O antigo Liceu de Portimão passou a chamar-se Escola Secundária Poeta António Aleixo.
Há alguns anos também passou a existir uma «Fundação António Aleixo» com sede em Loulé e que já usufrui do Estatuto de Utilidade Pública, o que lhe permite atribuir bolsas de estudo aos mais carenciados.

De vender a sorte grande,
confesso, não tenho pena;
que a roda ande ou desande
eu tenho sempre a pequena.

Eu não tenho vistas largas
nem grande sabedoria,
mas dão-me as horas amargas
Lições de Filosofia.

P'ra a mentira ser segura
e atingir profundidade,
tem de trazer à mistura
qualquer coisa de verdade.

Embora os meus olhos sejam
os mais pequenos do Mundo,
o que importa é que eles vejam
o que os homens são no fundo.

Fui polícia, fui soldado,
estive fora da nação;
vendo jogo, guardo gado,
só me falta ser ladrão.

Não é só na grande terra
que os poetas cantam bem:
os rouxinóis são da serra
e cantam como ninguém

Ser artista é ser alguém!
Que bonito é ser artista...
Ver as coisas mais além
do que alcança a nossa vista!

Sei que pareço um ladrão...
mas há muitos que eu conheço
que, sem parecer o que são,
são aquilo que eu pareço.

quinta-feira, 17 de julho de 2008

Poema de Manuel Alegre

As mãos

Com mãos se faz a paz, se faz a guerra.
Com mãos tudo se faz e se desfaz.
Com mãos se faz o poema - e são de terra.
Com mãos se faz a guerra - e são a paz.
Com mãos se rasga o mar. Com mãos se lavra.
Não são de pedras estas casas mas
de mãos. E estão no fruto e na palavra
as mãos que são o canto e são as armas.
E cravam-se no Tempo como farpas
as mãos que vês nas coisas transformadas.
Folhas que vão no vento: verdes harpas.
De mãos é cada flor cada cidade.
Ninguém pode vencer estas espadas:
nas tuas mãos começa a liberdade.
Manuel Alegre - "O Canto e as Armas", 1967

domingo, 13 de julho de 2008

Rio Guadiana

Lutegarda e eu

É que não há um céu com tal 'splendor

Nem rio azul tão belo e prateado

Como o Guadiana, o meu rio encantado

De mansas águas suspirando amor!



Lutegarda

(poetisa e socióloga)

vilarealense




quinta-feira, 10 de julho de 2008

Amar-te...

Pintura de Safira

Amar-te é um sentimento quente

Que está sempre presente,

Que continuamente se sente...

Amar-te é ser audaz,

É sentir a tua paz,



É querer guerra de beijos.

Ter a coragem de mil desejos.

É querer mimo incontido,

É um carinho a partilhar,

É sentimento bem sentido.



Amar-te? Oh amar-te, é alegria,

É transformar a noite fria

Num quente aconchego.

Amar-te é pintar o sentimento,

Aquele que sinto cá dentro



De uma forma total e pura

Numa tela bem segura,

E saber que o tema a expor

Pintado não a uma só cor

Será sempre o nosso Amor!



Safira

domingo, 6 de julho de 2008

Eu quero ser...




VIDA,
Para fazer nascer os
Que estão a morrer...


SOL,
Para fazer brilhar
Os que não possuem a lua...


LUZ,
Para iluminar os que
Vivem na escuridão...


CHUVAS,
Para correr toda a terra e molhar
Os campos secos e devastados...


LÁGRIMAS,
Para fazer chorar os
Corações insensíveis...


VOZ,
Para fazer falar os que
Sempre se ocultam...


CANTO,
Para alegrar os que vivem
Na tristeza...


LUAR,
Para brilhar nas noites
Dos amores incompreendidos...


FLOR,
Para enfeitar os jardins
No Outono...


SILÊNCIO,
Para fazer calar as vozes
Que marcaram os nossos corações...


GRITO,
Para soltar a dor dos
Que sofrem em silêncio...


Safira

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Chama-me...



Se um dia te der uma louca vontade de chorar...
Chama-me...
Não prometo que te vou fazer sorrir,
Mas posso chorar contigo.

Se um dia resolveres fugir...
Chama-me...
Não prometo que te vou pedir para ficar,
Mas posso fugir contigo.

Se um dia te der uma louca vontade de não falar com
Ninguém...
Mesmo assim chama-me...
Prometo ficar bem quieta.

Mas...
Se um dia me chamares e eu não responder...
Vem correndo ao meu encontro,
Talvez eu esteja a precisar muito de ti!

Safira

domingo, 29 de junho de 2008

POEMA


PRODÍGIPO DO BARRO

O frio barro modela os dedos

Sofridos e brancos

No movimento que os dilata...

Crescem como um manuscrito novo

Vendo a seiva correr da água

Que alimenta a argila..

A mão indica-nos o cântico do fogo

Que aquece a fórmula mágica...

Então...surge o prodígio...

Salpicado de surpresas...


Safira

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Gotas de Orvalho

Olhei-te e o teu corpo não era de carne, mas de uma doçura quase vegetal
onde as pétalas e o orvalho misturavam suas gotículas transparentes.
Levemente as células transformaram-se em veludo de tom arroxeado que eu
beijei, primeiro com suavidade e a crença aprensiva que se tem ao sangue.
Depois, com a certeza de que aquele corpo era só nosso e só a nossa boca
nele podia poisar. Intacta, sem se ferir. Dormias. Calma. Mas no silêncio,
eclodiu uma corda musical e na língua senti a estranheza do seu frio. Queria
sorver-te, como às gotas desse sangue que, por vezes, os espinhos deixam
nos meus dedos, num frenesim de vida quando colho as rosas.
Desdobrei a roupa para melhor te fruir. O umbigo bem desenhado estava
embutido na macieza da ondulação da curva do teu ventre. Um suave odor
penetrava-me as narinas, adoçando-as.
Este era o meu corpo - branco e puro. Tacteei-te, porque trazia perfumes na
polpa dos dedos. E entornei-os, um a um, como quem toca nas teclas dum
piano, dando-lhes um estado subtil de vida. Não sabia ainda que, tu própria,
o tinhas calado. Por dentro.
Estavas deslumbrante, entregue, sobre a cama, como uma gema de ametista,
arroxeada.
Faltava-me o brilho dos teus olhos, sempre acesos. Alimentados por um
braseiro que só em ti descobri e que se adoçava cada dia mais, na luz
trémula da chama da vela. Tínhamos visto as velas roxas com brilhos
reconvertidos dos postais antigos. Poisei-as no mesmo momento e que soube
que nunca mais faríamos amor. Mas também sabia que voltaria lá para as ir
buscar. Queri-as para gozar a chama tentadora, e ve-las gastarem-se por
entre os perfumes consignados ao acto amoroso...
Chove. E a água afasta os pássaros para longe. Num despojamento, tangendo
a música inaudível das tuas vésperas. Tocada em instrumentos que não vejo,
na repercussão que me espanta tu não oiças. Nem eu.
Fico à espera que me chames. Que me devolvas o nome. O que só tu sabes.
Eu sou ele, o nome.
...Mas tu não o fazes!

Safira

terça-feira, 24 de junho de 2008

A Rosa Amarela


A rosa amarela encheu a casa com o seu perfume. Ela sentiu sempre que, entre si e as flores amarelas, existia um diálogo quase instituído. Longo, enleante, com desassombro. E dialogavam... Na vigília que a noite lhes consentia, quando esse perfume era mais extenso, mais imposto.
Ela perguntava-se por vezes como era possível que, mesmo não a conhecendo muito bem, as pessoas lhe oferecessem flores amarelas. Eram dádivas arcaicas da profundeza dos tempos, onde a intuição comandava sem outra explicação que não fosse a do inconsciente conformado por uma disciplina que a torna una, e impossível de ser outra.
E pensava na Filogenia.
Recebi-as, e o seu coração recuava a um tempo ainda próximo, mas tão distante que não sabia nem podia reconstruir. Dele tinha reminiscências que por vezes lhe acudiam aos sonhos, tornando-os quase mágicos. Era no entre o sono e a vigília.
Aí, procurava aninhar-se nos lençóis macios, mornos e ainda revoltos, que envolvia em si como uma protecção, ou talvez como uma memória.
Sabia que as mulheres, desde tempos remotos, se envolviam em panos, modelados depois, e apenas, pelo próprio corpo. Pela pele que lhes recobria a carne tumefacta e latejante de candura e desejo em simultâneo. Quantas vezes pensou que, bem no íntimo, se considerava viciosa. Mas seria depravação aquela sensação gostosa, que lhe criava desejos inconfessados? E o mais estranho é que, bem no fundo, só se desejava a si própria.
Olhava-se longamente ao espelho e queria-se. O espelho deseja-a e a tortura fazia-a infeliz porque sempre a quiseram impor «amorfa» , como uma insígnia...
Ela foi crescendo e com ela uma eutimia que a fez resistir e hoje desejar-se no seu corpo de mulher.
Nos seios túmidos cresciam os mamilos cor-de-rosa, tão vivo na auréola mate. Olhava-se como quem aprecia um prodígio da natureza. E a sua língua molhava-se... e só não lambia o espelho porque ao mesmo tempo tinha medo que que a sua imagem fosse virtual. Então tocava-se com uma fogosidade abrasadora e «amava-se» até ao desvario. Uma, duas, muitas vezes até se sentir – entre. E tudo recomeçava mal a roupa, que se enrolava ao corpo, tombava, mostrando-a inteira e nua de roupagens e grilhetas.
Ela sentiu profundamente o cheiro da rosa amarela.
Sentiu-a e amou-a
Porque aquela rosa, tinha o sol nas suas pétalas macias e carnudas. Podia tentar reproduzi-la; mas nunca seria aquela rosa. Sabia, lá no fundo do seu querer, que se não reproduz o que só a natureza cria. E por isso a olhava, enleada, apaixonadamente.
Colocou-a em frente ao espelho e ele, devolveu-a intacta. Tão apetecida.
Então, lentamente abriu a boca e quis perpetuar aquele momento. Beijou-a, sentindo o seu perfume, e depois, devagar, mastigou, mastigou- a (sem se achar nigligente) saboreando.
... E sentiu, sentiu que, o sol a penetrava, numa estranha simbiose. Agora, ela pertencia-lhe porque passaria a fazer parte do seu corpo, como já fazia parte do seu querer, como alma.
No lábio inferior, sentiu algo humedecido, e viu no espelho uma gota vermelha, escorrendo. Então, a língua sorveu – a . E era agridoce e acidulada. E havia no seu sabor um perfume estranho e quase inumano.
Mas as suas células responderam-lhe que a amavam. E sentiu-se mais forte no seu corpo de mulher: mulher/flor, mulher/sol, mulher/sangue, mulher/espelho de si própria. Num desafio permanente aos seus sentidos. Desafiando-se... desafiando a hipótese como princípio, sempre!
Por entre o «martírio da rosa» e as células que a desejaram e que um dia por intelecção cremaria para de novo renascer... num raio de sol, numa rosa amarela, numa – talvez, Mulher...

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