segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

«A palavra é sagrada» (Maria José Abranches)



"Ensino do Português como língua materna ameaçado!

(…)
«Pois é preciso saber que a palavra é sagrada
Que de longe muito longe um povo a trouxe
E nela pôs sua alma confiada»

(…)


Com Fúria e Raiva, Sophia de Mello Breyner Andresen

Porque é preciso recordar e relacionar: as coisas não acontecem de súbito nem por acaso!

Estas opções políticas relativas ao ensino do Português no estrangeiro, que se traduzem nos cortes de cursos e despedimentos sumários de professores, ultimamente noticiados, não decorrem da crise política que agora atravessamos. São antes o resultado de escolhas e decisões que vêm sendo ponderadamente implementadas há vários anos, e cujo objectivo dá pelo nome de “internacionalização” da língua portuguesa. Este grandioso projecto tem como instrumento incontornável o Acordo Ortográfico de 1990, reactivado graças às astúcias, muito pouco democráticas, do “Acordo do Segundo Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa” (CPLP, São Tomé, Julho de 2004), aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 35/2008, de 16 de Maio de 2008.

Contrariamente ao que dizem os seus defensores, este Acordo não contribui para uma – visivelmente impossível – “ortografia unificada”, antes subalterniza a ortografia do português de Portugal, impondo-lhe, sobretudo no que toca às consoantes ditas “mudas”, as opções, já antigas, feitas pelo Brasil (1943), de acordo com a pronúncia brasileira, bem diferente da nossa. Ora esta diferença, que todos “ouvimos”, resulta de dois sistemas vocálicos inconfundíveis. Daí que só por má-fé se possa invocar, nesta matéria, o critério da pronúncia! É a ditadura uniformizadora do maior número, a pior inimiga da diversidade cultural e linguística da humanidade! E o objectivo final deste Acordo é, de facto, facilitar a “internacionalização” da língua portuguesa, mas na sua versão brasileira, à custa da vandalização e, a termo, da liquidação da nossa língua materna. Basta ver o percurso e o papel da CPLP em todo este processo!

Neste contexto, compreende-se que o ensino da sua língua aos portugueses, em Portugal e no estrangeiro, aos nossos emigrantes e luso-descendentes, não tenha grande significado. No país, a prioridade é a aplicação do Acordo Ortográfico, assim desmantelando irresponsavelmente os esforços de alfabetização levados a cabo nas últimas décadas! No estrangeiro, é a redução drástica do número de professores e de cursos destinados a ensinar a nossa língua materna àqueles que a ela têm direito! Deixo a Carlos Reis, grande defensor deste Acordo, a tarefa de confirmar o que tenho vindo a dizer:
“ (…) em espaços em que as comunidades portuguesas registam uma presença importante, será de encarar com cautela e em termos devidamente ponderados a possibilidade de articular acções com os seus representantes, já que a actuação daquelas comunidades se fixa sobretudo na questão do ensino do Português como língua materna, o que escassamente corresponde às preocupações de uma política de internacionalização do idioma.” (in Entrevista ao JL de 16-29 de Julho de 2008; o sublinhado é meu)
Em suma, é urgente reagir, pois, contrariamente ao que se diz por aí, ainda estamos muito a tempo de o fazer! É preciso saber e divulgar: há seis anos para a entrada em vigor generalizada do Acordo (Resolução da Assembleia da República n.º 35/2008), a contar de 13 de Maio de 2009, data do depósito do “instrumento de ratificação” do Acordo do Segundo Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (MNE, Aviso n.º 255/2010).

Defendamos o nosso direito, enquanto portugueses, ao respeito pela nossa língua materna, em Portugal e no estrangeiro! Recusemos o Acordo Ortográfico, concebido para servir interesses políticos e económicos, que não são os do povo português, e que nos inferioriza e desrespeita, assim como aos nossos descendentes, herdeiros da nossa língua!

Aproveito para comunicar que está na Internet uma Iniciativa Legislativa de Cidadãos contra o Acordo Ortográfico, que recolhe assinaturas de cidadãos eleitores (em papel; 35000 necessárias), para apresentar na Assembleia da República um “Projecto de Lei de revogação da Resolução da Assembleia da República n.º35/2008”, já referida acima: http://ilcao.cedilha.net

Resta-me dizer que falo com conhecimento de causa: por ter lido e analisado não só o próprio Acordo e a legislação que lhe diz respeito, mas também muito do que sobre estas questões se tem publicado; e pela minha própria experiência profissional e humana – professora de Português (e Francês), no ensino secundário, reformada desde 2006, vivi 15 anos em Paris (1965-1980), tendo aí ensinado a nossa língua, durante oito anos, na Universidade de Paris III.

Termino como comecei, com Sophia de Mello Breyner Andresen, A Palavra:


(…)
«Um homem pode enganar-se em sua parte de alimento
Mas não pode
Enganar-se na sua parte de palavra»


Lagos, 05 Dezembro 2011

Maria José Abranches Gonçalves dos Santos

domingo, 27 de novembro de 2011

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

terça-feira, 22 de novembro de 2011

sábado, 19 de novembro de 2011

terça-feira, 1 de novembro de 2011

A Grécia e a Troika

Acabo de ligar a televisão e ouvir o que se está a passar na Grécia. Ainda estou incrédula com os acontecimentos. Mas o texto que abaixo me permito reproduzir é uma análise muito clara do problema que a Europa enfrenta.

"Não estou no segredo dos deuses, mas imagino que os líderes europeus, ao aprovarem, na passada semana, as importantes decisões financeiras que se projetam sobre a Grécia, não faziam a mais leve ideia de que o respetivo governo podia vir a ter a intenção de levar a cabo um referendo para legitimar internamente a respetiva aceitação. A reação dos mercados a esta decisão grega foi a que seria de esperar.
Há um "drama" com que a Europa tem de viver, por muito que lhe custe ou que até lhe possa vir a custar o futuro: a democracia interna dos seus Estados. Já aqui falei disso há semanas. Os equilíbrios de cada sistema político, as diferentes realidades nacionais e a sua difícil compatibilidade (em especial, temporal) com a dinâmica global dos mecanismos da União Europeia tornam o dia-a-dia do projeto integrador numa caixa de surpresas. Às vezes, não as melhores, como é, flagrantemente, o caso."

Este é o post integral que o nosso Embaixador em Paris, Dr. Seixas da Costa coloca hoje no seu blogue duas-ou-tres.blogspot.com sobre tão grave questão.
Porque do meu ponto de vista a análise não podia ser mais justa, faço minhas as suas palavras.
A grande diferença, infelizmente para mim, é que eu nunca acreditei neste projecto europeu, no qual, para além da moeda, são mais as realidades que nos distanciam do que aquelas que nos ligam. E sempre considerei que numa Europa a duas velocidades - pelo menos - uma moeda comum iria impor uma espécie de governo comum. O que de facto tem vindo a acontecer sem que tal governo tenha sido investido do respectivo poder...

HSC

Retirado do blog "Fio de Prumo"

terça-feira, 25 de outubro de 2011

terça-feira, 18 de outubro de 2011

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

sábado, 8 de outubro de 2011

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Hoje é dia mundial do professor...

A data, instituída em 1966 pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), deve-se ao cumprimento das directrizes que norteiam a formação e as condições de trabalho dos professores.

Ambas organizações estabeleceram directrizes que norteiam a formação e as condições de trabalho dos professores, a participação deles e de seus representantes em decisões educacionais e as medidas que devem ser tomadas em cada país para a qualificação de profissionais e de ambientes de aprendizagem.

A efeméride, segundo a Unesco, é aproveitada para comemorar a profissão, cujo papel na educação de jovens e adultos permanece essencial.

A falta de professores qualificados torna-se num problema crucial. A Unesco estima que mais de 18 milhões de professores são necessários para que a meta de Educação Primária Universal (EPU) seja atingida até 2015.

Essa carência é especialmente aguda em África, onde mais de 3,8 milhões de professores são necessários para que a EPU seja atingida. A falta de professores, em muitos países do continente, faz com que uma sala de aulas albergue 60 ou mais alunos.

É geralmente reconhecido que educação de qualidade não pode ser oferecida em salas de aulas com mais de 40 alunos.

“Mesmo quando a oferta geral de professores é suficiente, áreas remotas e em desvantagem em todo o mundo podem sofrer com problemas persistentes de contratação e retenção de professores.

Essa falta de professores qualificados é um dos maiores desafios para as metas da Educação Para Todos (EPT)” – segundo mensagem conjunta da Unesco/OIT/Unicef.

Todos os anos comemora-se o Dia Mundial dos Professores e esta data deve servir para lembrar o quanto é imprescindível, numa sociedade de futuro, o professor, aquele que ensina, através da transmissão de conhecimentos, aquele que educa, através do exemplo que dá, aquele que “marca” com a sua conduta amiga, acolhedora e responsável.

Hoje, ser professor é muito mais que estar ou saber estar na sala de aulas.

Para todos os professores no activo, e para aqueles que já estão aposentados, a Unesco/OIT/Unicef endereça um forte abraço, com muita esperança, optimismo e admiração por abraçarem uma profissão de enorme desgaste, físico e psicológico, a quem tudo se pede, em troco de muito pouco ou, quantas vezes, quase nada.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Um cê a mais - Execelente Texto

Na qualidade de professora, já utilizo o novo acordo ortográfico, confesso que não tenho encontrado grande estímulo nesta nova forma de escrever, mas o que me resta ? Liderar uma rebelião qual D. Quixote a combater os moinhos de vento?

Fica este excelente texto que muito gostei de ler e aqui partilho

TEXTO


Quando eu escrevo a palavra acção, por magia ou pirraça, o computador retira automaticamente o C na pretensão de me ensinar a nova grafia.

De forma que, aos poucos, sem precisar de ajuda, eu próprio vou tirando as consoantes que, ao que parece, estavam a mais na língua portuguesa.

Custa-me despedir-me daquelas letras que tanto fizeram por mim.

São muitos anos de convívio.

Lembro-me da forma discreta e silenciosa como todos estes CCC's e PPP's me acompanharam em tantos textos e livros desde a infância.

Na primária, por vezes gritavam ofendidos na caneta vermelha da professora: - não te esqueças de mim!

Com o tempo, fui-me habituando à sua existência muda, como quem diz, sei que não falas, mas ainda bem que estás aí.

E agora as palavras já nem parecem as mesmas.

O que é ser proativo?

Custa-me admitir que, de um dia para o outro, passei a trabalhar numa redação, que há espetadores nos espetáculos e alguns também nos frangos, que os atores atuam e que, ao segundo ato, eu ato os meus sapatos.

Depois há os intrusos, sobretudo o R, que tornou algumas palavras arrevesadas e arranhadas, como neorrealismo ou autorretrato.

Caíram hifenes e entraram RRR's que andavam errantes.

É uma união de facto, e para não errar tenho a obrigação de os acolher como se fossem família. Em 'há de' há um divórcio, não vale a pena criar uma linha entre eles, porque já não se entendem.

Em veem e leem, por uma questão de fraternidade, os EEE's passaram a ser gémeos, nenhum usa ( ^^^) chapéu.

E os meses perderam importância e dignidade; não havia motivo para terem privilégios. Assim, temos janeiro, fevereiro, março, são tão importantes como peixe, flor, avião.

Não sei se estou a ser suscetível, mas sem P, algumas palavras são uma autêntica deceção, mas por outro lado é ótimo que já não tenham.

As palavras transformam-nos.

Como um menino que muda de escola, sei que vou ter saudades, mas é tempo de crescer e encontrar novos amigos.

Sei que tudo vai correr bem, espero que a ausência do C não me faça perder a direção, nem me fracione, e nem quero tropeçar em algum objeto.

Porque, verdade seja dita, hoje em dia, não se pode ser atual nem atuante com um C a atrapalhar.

Só não percebo porque é que temos que ser NÓS a alterar a escrita, se a LÍNGUA É NOSSA ...? ! ? ! ?


Um Abraço
João Oliveira Martins

terça-feira, 27 de setembro de 2011

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Caminhos

Fez-nos bem, muito bem, esta demora:
Enrijou a coragem fatigada…
Eis os nossos bordões da caminhada,
Vai já rompendo o sol: vamos embora.

Este vinho, mais virgem do que a aurora,
Tão virgem não o temos na jornada…
Enchamos as cabaças: pela estrada,
Daqui inda este néctar avigora!…

Cada um por seu lado!… Eu vou sozinho,
Eu quero arrostar só todo o caminho,
Eu posso resistir à grande calma!…

Deixai-me chorar mais e beber mais,
perseguir doidamente os meus ideais,
E ter fé e sonhar — encher a alma.

[Camilo Pessanha]

domingo, 18 de setembro de 2011

Despedida do TREMA

Não sei quem escreveu, mas quem
assina é o TREMA ...
É uma tremenda aula de
criatividade e bom humor,
por sinal, com acentuada inteligência.
A consequência não poderia ser outra:
uma agradável leitura...


Despedida do TREMA

Estou indo embora. Não há mais
lugar para mim.Eu sou o trema.
Você pode nunca ter reparado em
mim, mas eu estava sempre ali,
na Anhangüera, nos aqüíferos,
nas lingüiças e seus trocadilhos
por mais de quatrocentos e
cinqüentas anos.
Mas os tempos mudaram.
Inventaram uma tal de reforma
ortográfica e eu simplesmente tô
fora. Fui expulso pra sempre do
dicionário. Seus ingratos! Isso é
uma delinqüência de lingüistas
grandiloqüentes!...
O resto dos pontos e o alfabeto
não me deram o menor apoio... A
letra U se disse aliviada porque
vou finalmente sair de cima dela.
Os dois pontos disse que eu sou
um preguiçoso que trabalha
deitado enquanto ele fica em pé.
Até o cedilha foi a favor da minha
expulsão, aquele C cagão que
fica se passando por S e nunca
tem coragem de iniciar uma
palavra. E também tem aquele
obeso do O e o anoréxico do I.
Desesperado, tentei chamar o
ponto final pra trabalharmos
juntos, fazendo um bico de
reticências, mas ele negou,
sempre encerrando logo todas as
discussões. Será que se deixar
um topete moicano posso me
passar por aspas?... A verdade é
que estou fora de moda. Quem
está na moda são os
estrangeiros, é o K e o W, "Kkk"
pra cá, "www" pra lá.
Até o jogo da velha, que ninguém
nunca ligou, virou celebridade
nesse tal de Twitter, que aliás,
deveria se chamar TÜITER. Chega
de argüição, mas estejam
certos, seus moderninhos: haverá
conseqüências! Chega
de piadinhas dizendo que estou
"tremendo" de medo. Tudo bem,
vou-me embora da língua
portuguesa. Foi bom enquanto
durou. Vou para o alemão, lá eles
adoram os tremas. E um dia
vocês sentirão saudades. E não
vão agüentar!...
Nós nos veremos nos livros
antigos. Saio da língua para
entrar na história.
Adeus,
Trema.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

AVALIAÇÃO DE PROFESSORES, O EMBUSTE


Contrariamente ao que o anterior Governo se ocupou em afirmar até à exaustão, num processo em que foi secundado pelos sindicatos do sector, os professores do Ensino Público, na sua vivência profissional, sempre estiveram sujeitos a contínuos processos mais ou menos formais de avaliação funcional (e formativa) de desempenho.

Basta reflectir um pouco para constatar que não existe actividade mais escrutinada do que a actividade docente e que essa amplíssima exposição constitui mesmo uma especificidade intrínseca ao exercício da profissão.

O trabalho de um professor desenvolve-se necessariamente perante os seus alunos e respectivos encarregados de educação – 20-30 alunos, 40-60 encarregados de educação por turma, multiplicáveis até à dezena de turmas por professor…! – e em articulação estreita com os outros professores e auxiliares educativos, num dia-a-dia que, necessariamente, suscita partilha de informação e experiência e envolve trabalho formal de apreciação e comparação de situações dos alunos no âmbito da mera vivência colectiva escolar, num quadro sincrónico de várias disciplinas ou numa apreciação diacrónica de cada disciplina em anos subsequentes.

Se professores, alunos e encarregados de educação facilmente reconhecem essa particular condição de contínua exposição e consequente avaliação de desempenho dos docentes, como pode um Governo e alguns Sindicatos agir como se a desconhecessem? – e como pode a generalidade dos media reproduzir tal discurso ignorando o seu óbvio desenquadramento da realidade?

Não me atrevo a especular sobre as razões que terão estado por detrás de um tão bizarro procedimento, mas devo constatar que, para o fazerem, Governo (PS) e Sindicatos nos andaram a confundir com duas espécies de avaliação distintas: avaliação funcional, a tal avaliação permanente que é intrínseca ao desempenho da actividade docente; avaliação administrativa, uma aferição de exercício assente em critérios formalmente relevantes e que se destina a informar processos de progressão profissional.

Para patentear a muita má-fé de que enfermou todo esse processo, acresce que os governantes (PS), em reiteradas, injustas e até ofensivas intervenções, vieram acusar os (indolentes? levianos?) professores do Ensino Público de pretenderem fugir a uma «normal» avaliação (administrativa) de desempenho, depois de lhes terem «politicamente» suspendido esses mesmos processos de aferição profissional para, por contenção orçamental, lhes vedar o normal acesso à progressão na carreira.

Nos últimos anos, pois, têm os professores andado enredados nas malhas das burocracias que entretanto se geraram, levando à degradação do ambiente de trabalho nas escolas, à aposentação antecipada dos mestres mais experientes e a distorções na classificação dos alunos…

Da recente alteração de Governo, esperar-se-ia que o Ministro da Educação, Nuno Crato, um matemático, viesse introduzir critérios de razoabilidade na discussão com os Sindicatos de um novo processo de avaliação administrativa; questão que, num quadro de congelamento da progressão nas carreiras, deveria ser de interesse secundário, tal como sustentou esse mesmo governante, em Castelo de Vide (Universidade de Verão do PSD), ao afirmar que “o problema fundamental da educação em Portugal não é a avaliação dos professores”!

Contudo, tal não acontece… e alguns sindicatos, descurando problemas efectivamente prementes das condições de trabalho no Ensino Público – instabilidade laboral, escassíssima mobilidade horizontal e vertical (inexistência de concursos, carreiras congeladas), insuficiência de recursos, acesso gratuito à formação contínua, trabalho extraordinário não reconhecido, enfraquecimento de regimes da protecção (desemprego, doença) –, teimam em
dar prioridade à luta por um «modelo aceitável» de avaliação dos professores – questão que deveria ter sido liminarmente arredada da agenda, assim: “sem perspectivas de progressão na carreira nenhuma avaliação (administrativa, claro) faz sentido!”.

Acresce que, com o provável intuito oportunista de captar a adesão de docentes mais novos, o principal sindicato de professores tem vindo a investir numa (fácil) posição de princípio igualitário, afirmando rejeitar “a ‘leitura simples’ de se considerar que por estarem em topo de carreira, os professores não têm de ser avaliados da mesma maneira que os outros”; sem se aperceber de que, ao fazê-lo, está a dar um «tiro no pé», pois quanto mais vasto for o universo dos docentes sujeitos a notação mais se amplia a concorrência, a conflitualidade e a burocracia (o ruído) no seio do sistema de avaliação.

Essa situação até já terá feito sorrir maliciosamente Nuno Crato, habituado que está a fazer contas de somar e dividir para encontrar médias e determinar quotas sobre mapas de distribuição de resultados «gaussianamente» significantes e credíveis…!

Luis M. Mateus
(arquitecto, ex-professor na Universidade do Minho

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

De regresso

De volta, é inevitável o cortejo.
De um lado, ainda a fervilhar, a memória visual, a memória emocional, a memória que se recusa a esmorecer: a memória do deserto (litoral) e da indescritível beleza dos gigantescos vales «lunares», dos cachos de dunas sobre os leitos secos dos rios, do derrame das montanhas de areia fina e luminosa no mar e nas baías; dos quilómetros de praia selvagem; a memória do deserto (interior), do imenso e mágico silêncio, das luminosidades, das formas perfeitas das dunas douradas, ou da aridez pedregosa, dura, hostil, ou do hálito quente que nos envolve e derruba; a memória da hospitalidade, do cumprimento de mão no peito, do aceno.
Do outro lado, o regresso. O regresso à nossa portuguesa realidade que, ao contrário do que dizia o poeta, nada tem de espantosa. É a realidade do país acabrunhado, envergonhado, desistente; do triunfo da hipocrisia política e da mediocridade das elites que nos governam. É a realidade de vermos que nada, rigorosamente nada, se constitui como esperança. Pelo contrário, apenas se vê o revisto: reforço da injustiça social e crescimento da pobreza material, educativa e cultural.
É também o regresso à realidade europeia, gerida por políticos incapacitados, prisioneiros do arcaísmo das ideias dominantes e da força dos ilegítimos interesses instalados. É o regresso à realidade de um arquétipo de sociedade esgotado e falido. Depois de abdicar do seu modelo social, que tem o capitalismo europeu para oferecer? Oferece, sem pudor ético, a liberal desregulação, a liberal impunidade, a liberal depauperação.


De volta, o cotejo entre a memória e a realidade era inevitável. Está feito.
De volta, voltarei a exprimir desabafos, a emitir opiniões, a manifestar humores e a partilhar gostos, com quem generosamente quiser vir aqui espreitar.
Acerca da Educação e do resto...

Publicado por Mário Carneiro

domingo, 31 de julho de 2011

Enfim férias!

Enquanto partimos de férias deixo-vos com uma pintura minha...

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Poema Matemático


Um Quociente apaixonou-se
Um dia
Doidamente
Por uma Incógnita.

Olhou-a com seu olhar inumerável
E viu-a, do Ápice à Base...
Uma Figura Ímpar;
Olhos rombóides, boca trapezóide,
Corpo ortogonal, seios esferóides.

Fez da sua
Uma vida
Paralela à dela.
Até que se encontraram
No Infinito.

"Quem és tu?" indagou ele
Com ânsia radical.
"Sou a soma do quadrado dos catetos.
Mas pode chamar-me Hipotenusa."

E de falarem descobriram que eram
O que, em aritmética, corresponde
A alma irmãs
Primos-entre-si.

E assim se amaram
Ao quadrado da velocidade da luz.
Numa sexta potenciação
Traçando
Ao sabor do momento
E da paixão
Rectas, curvas, círculos e linhas sinusoidais.

Escandalizaram os ortodoxos
das fórmulas euclidianas
E os exegetas do Universo Finito.

Romperam convenções newtonianas
e pitagóricas.
E, enfim, resolveram casar-se.
Constituir um lar.
Mais que um lar.
Uma Perpendicular.

Convidaram para padrinhos
O Poliedro e a Bissectriz.
E fizeram planos, equações e
diagramas para o futuro
Sonhando com uma felicidade
Integral
E diferencial.

E casaram-se e tiveram
uma secante e três cones
Muito engraçadinhos.
E foram felizes
Até àquele dia
Em que tudo, afinal,
se torna monotonia.

Foi então que surgiu
O Máximo Divisor Comum...
Frequentador de Círculos Concêntricos.
Viciosos.

Ofereceu-lhe, a ela,
Uma Grandeza Absoluta,
E reduziu-a a um Denominador Comum.

Ele, Quociente, percebeu
Que com ela não formava mais Um Todo.
Uma Unidade.
Era o Triângulo,
chamado amoroso.
E desse problema ela era a fracção
Mais ordinária.

Mas foi então que Einstein descobriu a Relatividade.
E tudo que era espúrio passou a ser
Moralidade
Como aliás, em qualquer
Sociedade.

(Poema cuja autoria não foi possível identificar)

domingo, 24 de julho de 2011

Morreu Maria Lúcia Lepecki


Maria Lúcia Lepecki nasceu em Axará, no estado de Minas Gerais, no Brasil, mas estava radicada há várias décadas em Portugal, sendo uma profunda conhecedora da literatura portuguesa, que leccionou na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde foi professora catedrática a partir de 1981.

Brasileira de nascimento e portuguesa por casamento, era autora de obras como “O romance português contemporâneo na busca da história e da historicidade, “Uma questão de ouvido: ensaios de retórica e interpretação literária” ou “Meridianos do texto”.

Camilo Castelo Branco foi o centro da sua tese de doutoramento, em 1967, que iniciou anos antes na Universidade de Sorbonne, em Paris, e que viria a terminar na Universidade Federal de Minas Gerais, no Brasil. Fora no Brasil que terminara a licenciatura em Filologia Românica.

Começou a aprender latim, inglês e francês com a mãe, a partir dos nove anos. Numa autobiografia publicada em Dezembro de 2006 no Jornal de Letras, a que deu o nome de “Historinha de vida”, lembra ter crescido, no Brasil, numa casa “cheia de livros e de conversas interessantes”. “Era pouco dada a brincadeiras, de modo que a mamãe teve o bom-senso de me ensinar a ler aos cinco anos. Foi um sossego, a partir dali não me faltou diversão. Lia obsessivamente, do Monteiro Lobato ao Viriato Correia ou o Francisco Marins, e mais o que escarafunchava nas estantes do pai. Dickens, Scott, Dumas e até um livro de capa azul, ‘O Primo Bazílio’. Devorei-o, às escondidas, aos dez anos. Não entendi da missa a metade. Confidenciei o mal-feito ao meu pai, ia eu na casa dos quarenta. E ele: ‘Não te fez mal nenhum, filha’. Teve razão”.

No mesmo texto, recorda que lhe perguntavam com frequência se tinha tido dificuldade em adaptar-se a Portugal. “Na verdade, não”, escreve, para depois acrescentar: “Talvez por causa do meu pai, que, muito conhecedor de História e de Literatura portuguesas, trazia sempre à baila, a propósito ou talvez não, coisas tão diferentes como a “Crónica de Dom João I”, o Eça ou o Marquês de Pombal. Isto para não falar dos três exemplares de “Os Lusíadas”, esparramados estrategicamente pela casa: um no escritório, outro na mesinha da saleta e o terceiro na mesa de cabeceira do pai. Portugal integrava o imaginário da nossa casa. Isto seguramente me facilitou a vida”.

Colaborava em várias revistas e jornais portugueses e estrangeiros, sobretudo na área da literatura, como a Colóquio/Letras e o suplemento literário do Estado de São Paulo.

Em 2004, recebeu o prémio de ensaio literário da Associação Portuguesa de Escritores.

Em 2008, por ocasião do encontro literário Correntes d´Escritas, na Póvoa de Varzim, manifestou-se publicamente contra o novo acordo ortográfico. “"Eu sempre achei que o acordo ortográfico não é preciso: um brasileiro lê perfeitamente a ortografia portuguesa e um português lê perfeitamente a ortografia brasileira”, sustentou na altura.

O escritor Baptista-Bastos, que à Lusa confirmou a morte da ensaísta, referiu-se a Maria Lúcia Lepecki como uma “ensaísta notabilíssima e uma defensora da cultura portuguesa”.

Helena Roseta – que a conheceu no final dos anos 1990 quando organizava o espólio de Natália Correia e de quem Lepecki foi apoiante na candidatura à Câmara de Lisboa, em 2007 – recorda-a pelo “sentido físico muito forte” na forma como comunicava.

A graça que tinha “em pôr as coisas”, diz, traduzia “a delícia pela língua portuguesa” que a acompanhavam na soltura e no riso que lhe vinham de uma “grande vontade de viver”. Força que, recorda Roseta, deixava notar até numa certa sobranceria perante a doença. “Lembro-me, há uns anos, de me ter dito que tinha vencido um ‘cancrito’.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Uma barbaridade chamada acordo ortográfico


A língua portuguesa foi assassinada na escola. Parece que, no coração do Ministério da Educação, certas estruturas superiores ou intermédias têm tido mais poder do que o próprio titular da pasta e conseguem impor as suas concepções, a sua vontade programática ou a sua tremenda propensão para a inércia e para a inépcia.

No que toca ao português, os alunos desabituaram-se de tirar significados, não sabem consultar capazmente um dicionário, não se habituaram a ler autores significativos e muito menos a gostar deles. Não conseguem interpretar em condições um qualquer texto literário e exprimem-se cada vez com mais problemas e deficiências no tocante à extensão e propriedade do léxico, à articulação sintáctica, ao respeito de regras gramaticais elementares, à correcção da ortografia e até da pronúncia de muitos vocábulos. Tanto quanto sei, na área das matemáticas e da simples aritmética, passam-se coisas que, mutatis mutandis, acabam por ser de sinal muito semelhante.

Sobre essas falhas básicas, o actual ministro tem tido o desassombro de dizer verdades como punhos. É portanto de esperar que ponha em prática uma série de medidas para contrariar o presente estado de coisas.

Esse estado de coisas só poderá agravar-se com a aplicação nas escolas de uma barbaridade chamada Acordo Ortográfico. Se o ministro da Educação tem dúvidas a este respeito, basta-lhe convocar alguns especialistas, ou pedir para ver o parecer da Comissão Nacional da Língua Portuguesa, ou o dos seus próprios serviços (ao tempo da assinatura do AO, a Direcção-Geral do Ensino Básico e Secundário). Pode mandar analisar por gente competente não apenas as burricadas que o documento consagra, mas as consequências que ele vai ter ao nível da escola: facultatividades que redundarão na desortografia, confusões e equívocos, incertezas e flutuações permanentes na aprendizagem e na maneira de escrever, pronúncias desfiguradas, lesões na própria utilização escorreita da língua, custos astronómicos directos e indirectos na criação e aplicação do sistema.

O Programa de Governo é, a este respeito, de uma insensibilidade chocante, para não dizer de uma obtusidade clamorosa. Pode-se apostar dobrado contra singelo que nenhum dos seus autores leu jamais o texto do Acordo Ortográfico. Nenhum dos seus autores sabe do que fala ou escreve quando inclui nesse programa o propósito de "implementar" a aplicação da coisa. Nenhum dos seus autores ponderou, nem de perto nem de longe, as consequências dessa aplicação.

De boas intenções estão sempre os programas cheios. Mas este é um dos pontos em que o voluntarismo de natureza política deve ceder perante as objecções científicas e técnicas que foram suscitadas e a que nunca foi dada resposta convincente. É tempo de reexaminar essas objecções sem preconceitos nem chavões estéreis.

Suspender o Acordo Ortográfico (que, de resto, não pode considerar-se em vigor) e promover a sua revisão não é apenas uma questão de bom senso. É um imperativo nacional no tocante à defesa da língua e da cultura do nosso país. E essa hoje é uma das grandes responsabilidades de Nuno Crato.

Por Vasco Graça Moura

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Dia Internacional do Homem


Decretado pela UNESCO para dia 15 de Julho

Um teorema difícil de resolver!


Um teorema difícil de resolver!
A Maria partiu tudo…partiu a loiça toda!
Os cozinheiros vieram para a rua, com os tachos e as panelas. Juntaram-se às centenas, mas não conseguiram nada! Pelo contrário!
As receitas foram mudadas, ficaram mais horas a “cozinhar”, a mexer os caldos, a rapar os tachos, amuados na despensa… Depois, tinham que se espiar uns aos outros, sobretudo quando faziam “grelhados”. Sim, porque as “grelhas” aumentaram. Surgiu uma nova dieta, com menos calorias, não fossem os cozinheiros engordar! Além disso, a Maria passava a vida a chamar-lhes “malandros”! Tinham que estar a tempo inteiro na cozinha! Se não era para cozinhar, então inventassem receitas, menus, com criatividade, porque o objectivo era pôr tudo em pratos limpos! Da cozinha tinha que sair de tudo, mesmo que a qualidade não fosse grande coisa. Tinha que se dar uma nova oportunidade aos nabos, tinha que se certificar a sua qualidade!
Claro que a despesa aumentou! A Maria não parava, encomendava pareceres, pedia consultorias e até deu novas tecnologias a todos. Aos cozinheiros e aos clientes, vejam só! Até mandou renovar os estabelecimentos! Tinha que ser perfeito, porque a sua reputação internacional estava em causa!
Apesar de tudo, as coisas não estavam bem. E, antes que o caldo entornasse, o “chef” substituiu a governanta pela Isabelinha.
A Isabelinha chegou de avental branco, de luvas, com um sorriso enorme estampado no rosto. Ela sabia que era uma aventura difícil, talvez a maior aventura de toda a sua vida! E ria-se, ria-se muito!… Os cozinheiros protestavam, mas ela ria-se muito. E, com paninhos quentes, lá foi puxando a brasa à sua sardinha, insistindo nos grelhados, com ligeiras variações, à sua moda… Mas as sopas começaram a azedar. Os clientes andavam zangados, as facturas aumentavam e o dinheiro escasseava. O caldo entornou-se mesmo! E mudou-se a governanta! Desta vez seria um homem!
O homem chegou e, espantado certamente, pôs-se a olhar para os tachos! Tantos tachos, numa cozinha tão pequena! Tanta gente a comer da mesma panela! Tantas máquinas, tantos aparelhos! Tanto desperdício, tanto lixo! E tantos pobres, à porta, com fome!
O homem pôs-se a fazer contas, que nisso é ele bom, e ainda não falou… A equação é difícil de resolver!
Autora Conceição Couceiro

sábado, 11 de junho de 2011

Omens sem H

Por Nuno Pacheco. Hoje, no Público

Espantam-se? Não se espantem. Lá chegaremos. No Brasil, pelo menos, já se escreve "umidade". Para facilitar? Não parece. A Bahia, felizmente, mantém orgulhosa o seu H (sem o qual seria uma baía qualquer), Itamar Assumpção ainda não perdeu o P e até Adriana Calcanhotto duplicou o T do nome porque fica bonito e porque sim.

Isto de tirar e pôr letras não é bem como fazer lego, embora pareça. Há uma poética na grafia que pode estragar-se com demasiadas lavagens a seco. Por exemplo: no Brasil há dois diários que ostentam no título esta antiguidade: Jornal do Commercio. Com duplo M, como o genial Drummond. Datam ambos dos anos 1820 e não actualizaram o nome até hoje. Comércio vem do latim commercium e na primeira vaga simplificadora perdeu, como se sabe, um M. Nivelando por baixo, temendo talvez que o povo ignaro não conseguisse nunca escrever como a minoria culta, a língua portuguesa foi perdendo parte das suas raízes latinas. Outras línguas, obviamente atrasadas, viraram a cara à modernização. É por isso que, hoje em dia, idiomas tão medievais quanto o inglês ou o francês consagram pharmacy e pharmacie (do grego pharmakeia e do latim pharmacïa) em lugar de farmácia; ou commerce em vez de comércio. O português tem andado, assim, satisfeito, a "limpar" acentos e consoantes espúrias. Até à lavagem de 1990, a mais recente, que permite até ao mais analfabeto dos analfabetos escrever sem nenhum medo de errar. Até porque, felicidade suprema, pode errar que ninguém nota. "É positivo para as crianças", diz o iluminado Bechara, uma das inteligências que empunha, feliz, o facho do Acordo Ortográfico.

É verdade, as crianças, como ninguém se lembrou delas? O que passarão as pobres crianças inglesas, francesas, holandesas, alemãs, italianas, espanholas, em países onde há tantas consoantes duplas, tremas e hífens? A escrever summer, bibliographie,tappezzería, damnificar, mitteleuropäischen? Já viram o que é ter de escrever Abschnitt für sonnenschirme nas praias em vez de "zona de chapéus de sol"? Por isso é que nesses países com línguas tão complicadas (já para não falar na China, no Japão ou nas Arábias, valha-nos Deus) as crianças sofrem tanto para escrever nas línguas maternas. Portugal, lavador-mor de grafias antigas, dá agora primazia à fonética, pois, disse-o um dia outra das inteligências pró-Acordo, "a oralidade precede a escrita". Se é assim, tirem o H a homem ou a humanidade que não faz falta nenhuma. E escrevam Oliúde quando falarem de cinema. A etimologia foi uma invenção de loucos, tornemo-nos compulsivamente fonéticos.

Mas há mais: sabem que acabou o café-da-manhã? Agora é café da manhã. Pois é, as palavras compostas por justaposição (com hífens) são outro estorvo. Por isso os "acordistas" advogam cor de rosa (sem hífens) em vez de cor-de-rosa. Mas não pensaram, ó míseros, que há rosas de várias cores? Vermelhas? Amarelas? Brancas? Até cu-de-judas deixou, para eles, de ser lugar remoto para ser o cu do próprio Judas, com caixa alta, assim mesmo. Só omens sem H podem ter inventado isto, é garantido.

Jornalista

domingo, 5 de junho de 2011

quinta-feira, 2 de junho de 2011

As Fontes

Um dia quebrarei todas as pontes
Que ligam o meu ser, vivo e total,
À agitação do mundo do irreal,
E calma subirei até às fontes

Irei até às fontes onde mora
A plenitude, o límpido esplendor
Que me foi prometido em cada hora,
E na face incompleta do amor

Irei beber a luz e o amanhecer,
Irei beber a voz dessa promessa
Que às vezes como um vôo me atravessa,
E nela cumprirei todo o meu ser.

Sophia de Mello Breyner (1919-2004)

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Infinito...

O subtil, o reflexo, o vago, o indefinido,
Tudo o que o nosso olhar só vê por
um momento
Tudo o que fica na Distância diluído,
Como num coração a voz do
sentimento.
Tudo o que vive no lugar onde termina
Um amor, uma luz, uma
canção, um grito,
A última onda duma fonte cristalina,
A última nebulosa
etérea do Infinito…
Esse país aonde tudo principia
A ser névoa, a ser
sombra ou vaga claridade,
Onde a noite se muda em clara luz do dia,
Onde o
amor começa a ser saudade;
O longínquo lugar aonde o que é real
Principia
a ser sonho, esperança, ilusão;
O lugar onde nasce a aurora do Ideal
E
aonde a luz começa a ser escuridão…
A última fronteira, o último
horizonte,
Onde a Essência aparece e a Forma terminou…
O sítio onde se
muda a natureza inteira
Nessa infinita Luz que a mim me deslumbrou!…
O
indefinido, a sombra, a nuvem, o apagado,
O limite da luz, o termo dum
amor,
Tornou o meu olhar saudoso e magoado,
Na minha vida foi minha
primeira dor…
Mas hoje, que o segredo oculto da Existência,
Num momento
de luz, o soube desvendar,
Depois que pude ver das cousas a essência
E a
sua eterna luz chegou ao meu olhar,
Meu infinito amor é a Alma
universal,
Essa nuvem primeira, essa sombra d’outrora…
O Bem que tenho
hoje é o meu amigo Mal,
A minha antiga noite é hoje a minha aurora!…

[Teixeira de Pascoaes]

domingo, 22 de maio de 2011

Pedro Burmester, Mário Laginha e Bernardo Sassetti

Três grandes pianistas numa só sinfonia. Maravilha!!

domingo, 15 de maio de 2011

sábado, 7 de maio de 2011

Razões para não votar Sócrates...

As últimas sondagens dão empate técnico entre PS e PSD. Mas o grave, é estando o país como está, o grande fx#5&$)(/&/&$%#$a e aldrabão, estar a subir nas sondagens. O que será que se passa na cabeça de toda esta gente? às vezes tenho vergonha deste país de gente pequena e medíocre.

Votem em quem quiserem, mas não votem no pinóquio, porque isso é um atestado de burrice que colam na testa do país perante o mundo. Em Espanha, o Zapatero que não fez metade, está a ser fortemente penalizado, os espanhóis não perdoam. E cá? Há vários partidos para votar, portanto penalizem Sócrates nas eleições:

- quem nos atirou para a bancarrota

- quem nos deu fama de caloteiros e mentirosos perante a Europa

- quem nuca cumpriu o programa eleitoral

- prometeu 50 000 empregos e deu 700 000 desempregados

- quem nos colocou sem futuro nas próximas décadas, pelos recursos que teremos de afectar `a divida

- quem cerceou as liberdades, e colocou a bufaria e o medo no aparelho de estado

- quem agravou o problema da justiça, da saúde, da educação

- quem endividou o estado para dar contratos às empresas empregadoras dos bois xuxalistas

- quem criou um estado paralelo de fundações e institutos que alberga a máquina do PS

- quem prega pelo estado social mas reduziu e cortou reformas, subsídios sociais, salários entregou a saúde aos privados

- quem entregou estradas publicas (A25, A28...) aos privados e agora são pagas

- quem está metido em tudo o que são grandes processos de corrupção mal explicados

Como podem os portugueses entregar votos a um individuo sem escruplos, que fez tanto mal ao país?

quinta-feira, 5 de maio de 2011

O Dinheiro



O dinheiro é tão bonito,
Tão bonito, o maganão!
Tem tanta graça, o maldito,
Tem tanto chiste, o ladrão!
O falar, fala de um modo...
Todo ele, aquele todo...
E elas acham-no tão guapo!
Velhinha ou moça que veja,
Por mais esquiva que seja,
Tlim!
Papo.
E a cegueira da justiça
Como ele a tira num ai!
Sem lhe tocar com a pinça;
E só dizer-lhe: «Aí vai...»
Operação melindrosa,
Que não é lá qualquer coisa;
Catarata, tome conta!
Pois não faz mais do que isto,
Diz-me um juiz que o tem visto:
Tlim!
Pronta.

Nessas espécies de exames
Que a gente faz em rapaz,
São milagres aos enxames
O que aquele demo faz!
Sem saber nem patavina
De gramática latina,
Quer-se um rapaz dali fora?
Vai ele com tais falinhas,
Tais gaifonas, tais coisinhas...
Tlim!
Ora...

Aquela fisionomia
É lábia que o demo tem!
Mas numa secretaria
Aí é que é vê-lo bem!
Quando ele de grande gala,
Entra o ministro na sala,
Aproveita a ocasião:
«Conhece este amigo antigo?»
— Oh, meu tão antigo amigo!
(Tlim!)
Pois não!

João de Deus, in Campo de Flores

terça-feira, 3 de maio de 2011

O poder curativo dos professores

E é por isso que os docentes reclamam uma avaliação justa do seu desempenho. Uma avaliação em que se revejam, que os estimule a empreender e que os ajude no seu crescimento profissional.


Ser professor acarreta uma profunda carga de utopia e de imaginário. Com o lento passar do tempo e da memória coletiva, gerações após gerações ajudaram a elaborar a imagem social de uma profissão de dádiva absoluta e incontestável entrega.

O poder simbólico da atividade docente leva a que os professores sintam sobre os seus ombros a tarefa hercúlea de mudar, para melhor, o mundo; de traçar os novos caminhos do futuro e de preparar todos e cada um para que aí, nesse desconhecido vindouro, venham a ser cidadãos de corpo inteiro e, simultaneamente, mulheres e homens felizes. É obra!

Ao mesmo tempo que a humanidade construiu uma sociedade altamente dependente de tecnologias dominadoras, transferiu da religião para a escola a ingénua crença de que o professor, por si só, pode miraculosamente desenvolver os eleitos, incluir os excluídos, saciar os insatisfeitos, motivar os desalentados e devolvê-los à sociedade, sãos e salvos, com certificação de qualidade e garantia perpétua de atualização permanente.

O emergir da sociedade do conhecimento acentuou muitas assimetrias sociais. Cada vez é maior o fosso entre os que tudo têm e os que lutam para ter alguma coisa; entre os que participam e os que são marginalizados e impedidos de cooperar; entre os que protagonizam e os que se limitam a aplaudir; entre os literatos dos múltiplos códigos e os que nem têm acesso à informação.

E é este mundo de desigualdades que exige à escola e ao professor a tarefa alquímica de homogeneizar as diferenças.

Os professores podem e estão habituados a fazer muito e bem. Têm sido os líderes das forças de sinergia que mantêm os sistemas sociais e económicos em equilíbrio dinâmico. São eles que, no silêncio de cada dia, e sem invocar méritos desnecessários, evitam que muitas famílias se disfuncionalizem, que as sociedades se desagreguem, que os estados se desestruturem, que as religiões se corroam.

Mas não podem fazer tudo. Melhor diríamos: é injusto que se lhes peça que façam mais.

Particularmente quando quem o solicita sabe, melhor que ninguém, que se falseia quando se tenta culpabilizar a escola e os professores pelos mais variados incumprimentos imputáveis ao sistemático demissionismo e laxismo das famílias, da sociedade e do próprio estado tutelar.

É bom que se repita: os professores, por mais que se deseje, infelizmente não têm esse poder curativo. Dizemos infelizmente porque, se por milagre o tivessem, nunca tamanho domínio estaria em tão boas e competentes mãos.

E é precisamente porque nunca foram tocados por qualquer força divina que os professores, como qualquer outro profissional, também estão sujeitos à erosão das suas competências; que, como qualquer técnico altamente qualificado, também necessitam de atualização permanente. E é por isso que os docentes reclamam uma avaliação justa do seu desempenho. Uma avaliação em que se revejam, que os estimule a empreender e que os ajude no seu crescimento profissional.

Todas as escolas preparam impreparados. Até as que formam professores. Sempre foi assim e, daí, nunca veio mal ao mundo. É a sequência e a consequência da evolução dialética das sociedades e das mentalidades.

Por isso, centrar a discussão na impreparação profissional dos docentes, como se tal fosse estigma exclusivo desta classe e justificasse as perversas iniciativas que lançam a suspeita pública sobre a responsabilidade ética dos educadores no insucesso do sistema educativo e no desaire das políticas educativas que não têm vindo a sancionar, isso, dizíamos, traduz uma inqualificável atitude de desprezo pela verdade e pela busca de soluções credíveis e partilhadas.

Admitir que a educação pode resolver todos os problemas e contradições da sociedade, resulta em transformá-la em vítima evidente do seu próprio progresso.

Repetimos: os professores não têm esse poder curativo. Os docentes não podem solucionar a totalidade dos problemas com que se confrontam as sociedades contemporâneas, sobretudo se não tiverem os contributos substanciais dos outros agentes educativos e das forças significativas da sociedade que envolvem a comunidade escolar.

Evidentemente que a escola e os professores podem e devem contribuir para o progresso da humanidade e para o seu desenvolvimento político, económico, social e cultural. Porém, tal não é atingível apenas com meros instrumentos educacionais porque eles, por si só, não são capazes de estilhaçar o mundo de crescentes desigualdades e uma cúpula política sob a qual coexistem a injustiça, o desemprego e a exclusão social.

Os professores não têm esse poder curativo e, por favor, não os obriguem a ser mais do que são ou nunca serão o que o futuro lhes exige que venham a ser.

Prof. João Ruivo, 2011-05-02

domingo, 1 de maio de 2011

sábado, 30 de abril de 2011

CHRISTUS VINCIT



Não te deixes vencer pelo mal, vence o mal pelo bem,

sexta-feira, 29 de abril de 2011

sexta-feira, 15 de abril de 2011

quinta-feira, 14 de abril de 2011

sábado, 9 de abril de 2011

Tempo que passa...

Pergunto, ao tempo que passa,
se há quem governe o País!...
E o tempo mostra a desgraça,
que o Governo desdiz!...

Pergunto aos "boys" que levam
a massa nas algibeiras
e os "boys" ao roubo se entregam
- levam tudo, sem maneiras!...

Roubam sonhos, geram mágoas!...
Ai pobre do meu País!
Mergulhado em turvas águas,
seu fim está por um triz!...

Quem o pobre Povo esfola,
pede meças a quem diz
que um País, que pede esmola,
continua a ser feliz!...

Pergunto à fome, que grassa,
por quem lhe roubou o pão.
- Logo os golpes de trapaça
dá como sendo a razão!...

Vi florir grandes fortunas,
com os montantes roubados,
sem terem, como oportunas,
punições para os culpados!...

E o tempo não muda nada!
Ninguém faz nada de novo!
Vejo a pátria acabrunhada,
com a cruz, que leva o Povo!

Vejo a Pátria na voragem
dos que andam a roubar,
cobertos p'la sacanagem
dos que dizem governar!..

Vejo gente a partir,
Em busca doutras paragens,
que lhe possam garantir
a vida, com outras margens!...

Há quem te queira enganada,
ó Pátria do desalento
e fale por ti, coitada!
Entregue estás a um jumento!...

E o tempo, em derrocada,
num ruído cacofónico,
vai aumentando a parada
de delírio histriónico!...

Ninguém faz nada de novo
e o dinheiro que vai fugindo!...
Nas mãos vazias do Povo,
fica a miséria florindo!...

E a noite torna-se densa,
de fantasmas e desdita!...
Peço notícias ao tempo
e ele só nos mortifica!...

Há sempre uma alcateia,
que agudiza a desgraça!
Há sempre alguém que semeia
injustiça e trapaça!...

Neste tempo de trapaça,
com personagens tão vis,
só mesmo com arruaça,
p'ra lhes partir o nariz!...

Mesmo na noite mais triste,
em tempo de podridão,
Sócrates ainda resiste,
com a lábia de aldrabão!...

(Autor desconhecido)

terça-feira, 5 de abril de 2011

A estratégia de Sócrates era...



A estratégia de Sócrates era controlar os meios de comunicação social, controlar a justiça, controlar a educação, entre outras.
Com a educação arranjou várias estratégias:
1- Uma avaliação que dividisse os professores para que não houvesse grandes ondas de descontentamento. Avaliar apenas uns com aulas assistidas, quem quisesse ou fosse obrigado, devido aos escalões.
2- distribuir magalhães, de norte a sul do país, dando a entender que estava muito preocupado com as crianças e o ensino. Ao mesmo tempo convencia os pais, com isto e a escola a tempo inteiro. Depósito de crianças de manhã à noite sem tempo para brincar, mas muito do agrado das famílias.
3- Novas oportunidades. Aqui o cidadão comum forma-se em meia dúzia de dias.
Em termos estatísticos, e para exportar para a Europa o resultado disto, é do melhor que há.Uns milhares subiram o seu grau académico, sem qualquer esforço ou saberes científicos.Aos próprios interessou. Compreende-se porquê.
Toda a estratégia de Sócrates, é criar uma massa de analfabetos, gente sem qualquer poder crítico, mas que fica fascinado, perante tudo o que ele lhe concedeu de fácil. Esta gente, que são muitos, serão capazes de votar nele, em sinal de gratidão.
Há também aqueles que anos a fio tem sobrevivido, graças aos subsidios da pobreza, do desemprego, da desgraça. Muitos que não querem trabalhar, e que vêem no Sócrates um gajo simpático, pois tem alimentado estas fantasias anos a fio, sem exigir nada em troca.Estes homens e mulheres, poderão dar o seu voto novamente ao PS, em sinal de gratidão.
Por tudo isto eu não sei o que irá acontecer no futuro…
Ainda alimento esperanças, que o discurso do Sócrates, desvia-se cada vez mais, do de uma pessoa normal, com responsabilidades, e que ele possa estar à beira da loucura.
Mas será, que todos o que tem intenção de votar nele, conseguem reconhecer isso??...

sábado, 2 de abril de 2011

Cântigo Negro



“Vem por aqui” — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: “vem por aqui!”
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali…
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos…
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: “vem por aqui!”?
Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí…
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?…
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos…

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios…
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios…
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: “vem por aqui”!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou…
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!

José Régio

domingo, 27 de março de 2011

Valeu a pena, vou celebrar!



Na história da profissão docente, hoje é um dia relevante.
É o dia em que acaba de ruir um projecto deontologicamente inaceitável, porque conceptualmente inadequado, politicamente irresponsável e tecnicamente aventureiro e incompetente. Refiro-me ao hoje extinto modelo de avaliação do desempenho dos professores, descendente directo do modelo de Lurdes Rodrigues.
Ao fim de três longos anos de demonstração da inadequação, de denúncia da irresponsabilidade e de comprovação do aventureirismo e da incompetência, chegou o momento em que a disformidade legislativa foi atirada ao lixo.
Não sabemos o futuro. Não sabemos o que aí vem. Mas sabemos o que hoje terminou.
Independentemente das hipocrisias políticas e dos oportunismos eleitoralistas de vários deputados, este dia pôs um ponto final a uma aberração e a uma indignidade.
Foram muitos os professores que lutaram para que isto fosse possível. Valeu a pena pugnar.
Vale a pena celebrar. Eu vou celebrar.

quarta-feira, 23 de março de 2011

segunda-feira, 21 de março de 2011

terça-feira, 8 de março de 2011

Dia Internacional da Mulher



MESTRES DO CAMINHO: ELAS, BRILHANTEMENTE, MULHERES...

MULHER...

Mulheres, magia e encanto,
raça e ternura,
bravura... sensual..
Estrela da rua,
um cavalo do luar...
Na lida , a batalha;
na vida, um atalho
para os sonhos do porvir...
Lavadeiras, doutoras,
carpiteiras, poetizas,
garis, parideiras,
pensadoras e cantoras,
arizes no palco,
jardineiras do tempo,
andorinhas no mar...

Jorge Bichuetti

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Vigília de Verão

Um incandescente pulmão
espera no Norte pelo
cigarro do sol. O teu
rosto adormecido parece
uma mensagem. Mas quem
a envia? Muito caminhámos
lado a lado
no inclinado caminho dos anos.
Por fim as pedras tornaram-se
em escuridão, mas o rosto
de um homem é mais claro que
o seu pensamento, o seu nome
mais profundo que a escuridão
dos sentimentos onde
está fechado. Agora
a noite é insensível ao dia.
Agora o teu sono é todo o crepúsculo
que resta.


Gösta Agren
(Trad.: José Agostinho Baptista)

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

POEMA BARROCO



Os cavalos da aurora derrubando pianos
Avançam furiosamente pelas portas da noite.
Dormem na penumbra antigos santos com os pés feridos,
Dormem relógios e cristais de outro tempo, esqueletos de atrizes.

O poeta calça nuvens ornadas de cabeças gregas
E ajoelha-se ante a imagem da Nossa Senhora das Vitórias
Enquanto os primeiros ruídos de carrocinhas de leiteiros
Atravessam o céu de açucenas e bronze.

Preciso conhecer meu sistema de artérias
E saber até que ponto me sinto limitado
Pelos sonhos a galope, pelas últimas notícias de massacres,
Pelo caminhar das constelações, pela coreografia dos pássaros,
Pelo labirinto da esperança, pela respiração das plantas,
E pelos vagidos da criança recém-parida na Maternidade.

Preciso conhecer os porões da minha miséria,
Tocar fogo nas ervas que crescem pelo corpo acima,
Ameaçando tapar meus olhos, meus ouvidos,
E amordaçar a indefesa e nua castidade.

É então que viro a bela imagem azul-vermelha:
Apresentando-me o outro lado coberto de punhais,
Nossa Senhora das Derrotas, coroada de goivos,
Aponta seu coração e também pede auxílio.

Murilo Mendes

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

O ASSINALADO



Tu és o Louco da imortal loucura,
O louco da loucura mais suprema.
A terra é sempre a tua negra algema,
Prende-te nela a extrema Desventura.

Mas essa mesma algema de amargura,
Mas essa mesma Desventura extrema
Faz que tu'alma suplicando gema
E rebente em estrelas de ternura.

Tu és o Poeta, o grande Assinalado
Que povoas o mundo despovoado,
De beleza eterna, pouco a pouco.

Na Natureza prodigiosa e rica
Toda a audácia dos nervos justifica
Os teus espasmos imortais de louco!

Cruz e Sousa

domingo, 30 de janeiro de 2011

Poema de Joaquim Pessoa, dedicado à corja que nos governa.



"Obrigado, excelências.
Obrigado por nos destruírem o sonho e a oportunidade
De vivermos felizes e em paz.
Obrigado
Pelo exemplo que se esforçam em nos dar
De como é possível viver sem vergonha, sem respeito e sem
Dignidade.
Obrigado por nos roubarem. Por não nos perguntarem nada.
Por não nos darem explicações.
Obrigado por se orgulharem de nos tirar
As coisas por que lutámos e às quais temos direito.
Obrigado por nos tirarem até o sono. E a tranquilidade. E a alegria.
Obrigado pelo cinzentismo, pela depressão, pelo desespero.
Obrigado pela vossa mediocridade.
E obrigado por aquilo que podem e não querem fazer.
Obrigado por tudo o que não sabem e fingem saber.
Obrigado por transformarem o nosso coração numa sala de espera.
Obrigado por fazerem de cada um dos nossos dias
Um dia menos interessante que o anterior.
Obrigado por nos exigirem mais do que podemos dar.
Obrigado por nos darem em troca quase nada.
Obrigado por não disfarçarem a cobiça, a corrupção, a indignidade.
Pelo chocante imerecimento da vossa comodidade
E da vossa felicidade adquirida a qualquer preço.
E pelo vosso vergonhoso descaramento.
Obrigado por nos ensinarem tudo o que nunca deveremos querer,
O que nunca deveremos fazer, o que nunca deveremos aceitar.
Obrigado por serem o que são.
Obrigado por serem como são.
Para que não sejamos também assim.
E para que possamos reconhecer facilmente
Quem temos de rejeitar."

Joaquim Pessoa

sábado, 15 de janeiro de 2011