quinta-feira, 1 de julho de 2010

BRINDEMOS MEU AMIGO



Décimo Oitavo Cálice

Quando até a literatura é estrangeira

Na regra dos noves fora mais antiga

É condição redobrada ser a primeira

A contar de quanto trauteio a cantiga

De ficar absorto a soletrá-la pertinaz

Já que o corpo por repouso tudo aceita

Incluindo ler, que só à mente deleita,

Seja a tarde longa e calma ou fugaz

Que sempre voará se no fazer apraz.



Medido o tempo por esta clepsidra

Onde cada segundo é uma frase lida

A pingar da pipeta do entendimento

Tece enredos quem só decepa a Hidra

Lhe sega as cabeças do medo à vida

Tira à serpente gigante o tormento

E lhe dá em troca o jeito sagaz melado

De um S com asas dito voo soletrado

E no sibilo de uma língua enrolado.



A primeira letra de um nome, portanto

Só anda repetido adiante, se avança

Revestido na aliança serena do canto

Em que o compasso é passo e balança

Braço dado fazendo do par a esperança

Deste Alentejo como um lamento cantado

Na sesta amena ao ritmo arado do beijo

Que é outro tanto do canto do S no desejo.



Boca a desenrolar-se é só mandorla da fé

Num zero que a cabala indica, mas que é

O seixo do ábaco se a unidade multiplica

Por dez, por cem, por mil e até o infinito

Estica, dando ao ver o que só se acredita

Existir, sendo esse anel o aro de espírito

Suficiente à matéria como forma de lente

Prà visão num oito alcançar o ponto fito

Que nunca é visto só pelo olhar da gente.



Quem já viu longe e para lá do horizonte

Que a eternidade tem por coisa tão certa

Como uma árvore, colina, rio, ou monte

Habitado por família unida, sã e desperta?

Então, esse sabe até reconhecer a aresta

Que há no distante Sol cuja seta acerta

Raio de alerta e sobre a alma o rio apresta

Ao tempo contínuo, sem fim, sólida ponte!


2010-07-01

Joaquim Castanho

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